Dançar a Vida

Prefácio (de uma obra que já é inteira mesmo sem ele)

A obra da Lourdes Maneta é anti-sistemática. Ou, melhor dito (porque «ser-anti-qualquer-coisa» sería «ser-sistemáticamente-qualquer coisa-contrária-a...» e a Lourdes não exibe ser anti-nada!), é a-sistemática. Não tem pretensões a compêndio nem a manual. E, no entanto, é uma obra contínua, fluida e clara.

A fórmula mágica da Lourdes Maneta é a sua unidade. Mais precisamente, o seu constante regresso à unidade. Porque ela parte muitas vezes, sem avisar, e por caminhos desconcertantes, por vezes novos, por vezes parecendo tão usados que nada mais teriam a dizer.... E a sua obra consegue sempre superar: ela faz a unidade na diversidade, um só fio condutor na pluralidade, um só regresso para muitas partidas.

Em todas elas (as idas, as vindas, as estadias...) a Dança da Vida. A Lourdes, como a bailarina, mantém-se na primeira linha: dançando. Porque há vários modos de existir (e, portanto, de dançar): o seu modo é frontal, primeiro e primordial. Naquilo que faz (ou escreve, ou pinta, ou motiva, ou indica) o movimento sugerido é essa dança aleatória e inspirada, que recolhe o improvável e o provável com igual gratidão.

O universo e as suas dádivas, a pessoa humana e os seus valores, a arte e as suas metáforas, tudo se integra e é integralmente oferecido na proposta terapêutica da Lourdes Maneta.

Este livro que ora prefacio, com gosto e amizade, é um espelho da sua Autora. Quando a conheci, nos bancos da Faculdade de Psicologia, ficava eu necessáriamente do lado do estrado do professor. Enquanto aluna, a Lourdes chamava-me a atenção ao aliar, de um modo raro, dois (aparentemente) inconciliáveis bens: maturidade e frescura. Talvez por isso tenha logo intuido que as paredes de uma academia seríam, para aquela aluna, apenas uma parcela existencial, apenas mais uma valsa, apenas mais uma tonalidade.

Hoje, as duas do mesmo lado do banco (o tempo passa, a amizade fica), olho a obra da Lourdes e penso: existem pessoas (únicas, como ela) para quem o mundo nasce cada dia. Cada dia, ao acordar, possuem essa sublime alegria, a capacidade de acreditar que nada se repete e que tudo é belo, gratuito e imenso. Ao ler este livro, percebi o desejo de partilha da sua Autora: acreditemos também!

Maria João Castelbranco da Silveira