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O diário é seguramente o mais íntimo dos géneros literários. Repositório de confidências - e inconfidências - escritas sob a febre das emoções, partilhá-lo com o público é um acto de coragem, mais ainda quando o seu autor é um intelectual conhecido e reputado e quando as páginas que nos oferece estão cheias de revelações da sua vida real por oposição à ficção a que nos habituou.
Iniciado em 1958 - tinha Mário Cláudio apenas 16 anos - e interrompido por mais de uma vez até à actualidade, o presente livro, que funciona também como um maravilhoso álbum fotográfico, traz-nos relatos de almoços em família, de idas ao supermercado ou de obras em casa, a par de visitas a exposições, leituras de livros, períodos de escrita intensa, viagens, encontros com figuras que marcaram ou marcam ainda a vida nacional.
Nestas páginas, desfilarão por isso Agustina ou Lobo Antunes, Carlos Avilez ou Graça Lobo, Eugénio de Andrade ou Vasco Graça Moura, José Rodrigues ou Manoel de Oliveira, Rodrigo Guedes de Carvalho ou Gonçalo M. Tavares; mas não faltam igualmente os amigos certos, ou os relacionamentos - também amorosos - que num dado momento podem ter entrado em confronto, mas cujo afecto verdadeiro acabou tantas vezes por não deixar abalar.
Com a beleza dos pequenos instantes com os animais de estimação, com a mágoa que o reconhecimento público, mesmo que desejado, não consegue apagar, esta é uma obra pessoal escrita com toda a frontalidade e, ao mesmo tempo, um documento literário importantíssimo de uma época.