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“Quando li pela primeira vez estas setenta cartas de amor, do Paulo José Miranda, fiquei desconfiada: se não tivesse o nome do autor na primeira página, teria a certeza de que estes textos tinham chegado ao papel pela mão de uma mulher. Se são hoje muitos os casos em que um homem canta o corpo da mulher, poucos são aqueles em que esse corpo, de todos os modos e por todos os lados desejado, é também alma - alma a revis(i)tar com a mesma intensidade com que se revis(i)ta a pele de quem se ama. Sendo certo que as almas caem, com mais peso que os corpos, no abismo; são mais vulneráveis a condenações. Acrescente-se que menos ainda são os casos em que o homem tanto e de tão longe se demora na impossibilidade do amor - escrevendo-o, isto é, cristalizando essa mesma impossibilidade, assumindo-a como sua, tomando-a só para si: "Não é o teu rosto que chora, mas quem o desenha no coração das árvores."
Ora, quem escreve estas cartas é, na verdade, um homem, dirigindo-se a uma mulher. Roland Barthes sustenta que as cartas amorosas têm sempre destinatário, mesmo que seja um destinatário futuro ou uma identidade fantasmática. E, contudo, sublinha que "o discurso amoroso é (...) de uma extrema solidão", não havendo ninguém disposto a defendê-lo. Todas as Cartas de Amor do Paulo José Miranda defendem um discurso exageradamente temido nestes tempos em que temos medo de tudo aquilo por que deveríamos estar gratos. Não pela obrigação de honrarmos a narrativa de que outrora alguém morreu por nós, para nos salvar, mas por construirmos as nossas vidas na expectativa, nunca na certeza, de encontrarmos alguém - corpo e alma - que esteja disposto a morrer por nós, para nos condenar. "Ingratidão, meu amor, não é ficarmos esquecidos de agradecer o que nos deram. Ingratidão é não levarmos até às últimas consequências o que nos deram."
Estou grata por existirem ainda mãos que levem até às últimas consequências a possibilidade de escrever o amor.»
Apenas tem um pequeno apontamento na primeira página do livro, como se pode rever na segunda foto.
O preço inclui portes de envio em correio editorial.