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Entre tantos episódios que os Evangelhos relatam, o da pecadora que se arrisca por um território hostil apenas para tocar em Jesus (Lc 7,36-50) acabou por se tornar o meu objeto de trabalho bíblico durante anos, mas não só de trabalho: também de emoção, de imaginação, de afeto e de fé. O convívio com esse texto mudou completamente o meu olhar sobre Jesus e, com isso, posso dizê-lo, mudou também a minha vida.
Devo ter ouvido antes este episódio dezenas de vezes, mas o que me fez caminhar para ele intrigado, movido pelo espanto, foi um comentário do romancista japonês Shusaku Endo, no seu livro Uma vida de Jesus. O que Endo defende é que a peripécia da pecadora intrusa, que faz tudo para tocar naquele hóspede, é um momento central no Evangelho de Lucas, mais eficaz na transmissão de Jesus do que muitos outros, inclusive do que as histórias de milagres, porque dá de Jesus uma imagem surpreendentemente real. Confesso que tive um sobressalto. A verdade é que, se até àquele momento me tivessem perguntado, eu diria que o trecho de Lc 7,36-50 é interessante, sim, singular na sua temática, e, pensando nas lágrimas da mulher, emocionalmente intenso. Não diria, porém, tratar-se de uma peça privilegiada para abordar o sentido de Jesus, como hoje creio. Que segredos estavam escondidos aos meus olhos?
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(Luis Santos / LuisXXI)