CRIANÇAS COM DOR –

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CRIANÇAS COM DOR –
Autor(a)
Anada Fernandes
Género Literário
Autores Portugueses
Desenvolvimento pessoal
Livros práticos
Não ficção
Outro
Sinopse

CRIANÇAS COM DOR –

Anada Fernandes

Edição: Quarteto

ISBN:972853549X

Páginas: 284

Dimensões: 230x160 mm

Peso: 471

 

Exemplar como novo

 

PREÇO: 10.00€

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Envio em Correio Registado acresce a taxa em vigor.

 

 

Prefácio

 

É do conhecimento geral que a dor é uma condição inalienável da existência humana. Emaranha-se na diversidade das situações que os seres humanos experimentam e ganha heterogeneidade de configurações sociais, pluralidade de campos de extensão e variabilidade de graus de intensidade, que se constituem como elementos dificilmente perscrutáveis pelos modelos de intelegibilidade social e científica do que é o fenómeno dor, quando entendido como fenómeno global.

 

A dor é uma mera reacção fisiológica e não suscita sempre as mesmas sensações e os mesmos modos de defesa. Por outro lado, a dor não é proporcional à gravidade da lesão que a origina, nem é simplesmente decalcada da percepção sensorial construída pela consciência individual. Existem múltiplos estudos que provam que os limiares de sensibilidade à dor estão intimamente articulados ao tecido social e cultural onde os indivíduos se inserem, nomeadamente aos seus valores, à sua visão do mundo e às suas trajectórias pessoais e sociais.

 

O homem "aprende" a reconhecer a sensação de dor e a ligá-la a um sistema de significados, de sentidos e de valores. Por isso mesmo, pode-se afirmar que o homem faz a dor, o que permite afirmar, simultaneamente, que a dor não pode constituir um simples dado biológico, mas pode ser objecto de um processo de humanização, variável no espaço e no tempo.

 

Vários estudos realizados no âmbito da investigação médica, da psicologia do desenvolvimento infantil e da psicanálise provam que a reacção dos indivíduos à dor se enraíza, em termos de tempo, nos primeiros anos de vida e, em termos dos contextos familiares da infância, na atenção prestada pelos pais, ou os seus substitutos, às doenças infantis e aos ferimentos. Ou seja, os lugares de socialização são os lugares onde se constroem os processos de humanização dos dados sobre a dor. Também é nestes lugares que se "educam" as atitudes e os comportamentos face às percepções e às emoções e se ritualiza a sua expressividade. Nas experiências sociais dos indivíduos vão-se interpondo vários outros sobre a designação do que é dor e sobre a recomendação da resignação ou da resistência aos seus efeitos, nunca se sabendo muito bem o que cabe a cada um na estruturação, sempre singular e particular, da fenomenologia da dor. Nesses percursos produzem-se as alquimias das relações sociais com as relações afectivas e com os valores que as apoiam.

 

Assim, é possível falar na construção social da dor, como inclusiva das visões do mundo de todas as sociedades humanas, conferindo-lhe sentidos e valores e daqui se extrai, como um primeiro dado societal, a significação colectiva atribuída à dor e às manifestações ritualizadas com que se exprime face aos outros. Em cada sociedade organizam-se redes de causalidade onde a sua origem é explicada. A partir dos sistemas terapêuticos existentes, cada sociedade dota-se dos meios práticos e simbólicos para a combater. Em cada sociedade define-se, também, uma implícita legitimidade da dor, que circunscreve as circunstâncias sociais, culturais ou físicas consideradas dolorosas, provocando a exclusão de outras eventuais legitimidades da dor apoiadas em circunstâncias particulares e sancionadas por padrões de dor habitual.

 

Simbolicamente, cada sociedade sinaliza os limites do que é lícito considerar como dor, dissuadindo os excessos e as contenções inesperadas e, é neste processo, em que se realiza o jogo dos juízos de aprovação e de reprovação dos indivíduos que protagonizam a dor, que os profissionais de saúde detêm um papel central.

 

As considerações sobre a dor, acima apresentadas, pretendem, justamente, mostrar como qualquer investigação sobre a dor é complexa e difícil. A investigação cujo objecto se centra no quotidiano do trabalho de dor sobre crianças hospitalizadas, de que resultou, em boa hora, a publicação deste livro, é disso exemplo. A sua autora escolheu um tema de difícil problematização científica, pois podendo constituir-se como objecto de múltiplas ciências, nenhuma delas, em particular, dispõe de condições teóricas e metodológicas para o controlar, senão apenas parcialmente. Assim, foi particularmente difícil a escolha do quadro teórico organizador da pesquisa, que pudesse apoiar a autora em todos os momentos da pesquisa, sem originar dispersão de dimensões de análise, nem fragmentação conceptual.

 

Acresce a esta complexidade uma outra, a de este estudo se centrar na dor das crianças, confrontando-se com todas as categorizações comodamente instaladas sobre o que é ser criança, ser criança doente e essa criança padecer de dor. Estas categorizações acabam por sobrecarregar o olhar científico e forçá-lo à aquiescência. Neste estudo, sem que estivesse expressamente formalizado o compromisso com o rompimento destas representações, paulatinamente, num esforço notável de distanciamento face à atmosfera emocional das situações observadas e analisadas, este rompimento vai-se fazendo, sem nunca se registar qual-quer sinal de desistência da sensibilidade e da perspicácia.

 

Gostaria ainda de salientar como, perante a densidade da informação recolhida, a autora consegue destrinçar as relações de inteligibilidade e sentido captadas na observação e na recolha dos discursos dos entrevistados, num trabalho de interpretação dos dados delicado e moroso, mas cujos resultados evidenciam as diversas configurações assumidas pelo trabalho sobre a dor. Mostrou bem como a insistência na subjectificação dos processos que envolvem a dor oculta a dificuldade da sua objectificação, cujas razões não se prendem exclusivamente à acção individual ou à situação particular, mas se prendem principalmente com os factores de natureza organizacional e estrutural, que estão para além dos indivíduos e dos seus contextos específicos de trabalho.

 

Não poderia terminar o prefácio a este livro sem realçar as qualidades pessoais e científicas da sua autora, que fui descobrindo ao longo do tempo que durou este percurso. Refiro-me ao seu empenhamento no tema escolhido, ao zelo no cumprimento das etapas de trabalho, ao rigor da sua postura científica, à sua exigência pessoal e à honestidade intelectual que moldaram este trabalho e, tenho a certeza, que moldarão a sua vida profissional e pessoal.

 

Lisboa, 8 de Setembro de 2000

Graça Carapinheiro

Idioma
Português
Preço
10.00€
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