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O ERRO DE DIAGNÓSTICO – VOL. I
Augusto Vaz Serra
Professor de Clínica Médica de Faculdade de Medicina de Coimbra
2ª Edição
Coimbra – 1974
Páginas: 348
Dimensões: 230x155 mm.
Exemplar em bom estado.
PREÇO: 23.00€
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PREFACIO DA 2ª EDIÇAO
O primeiro volume do «Erro de Diagnósticos về agora a 2.° edição, na altura em que ser publicado o 2. volume de observações congéneres, todas elas visando apenas o fim de alertar o clinico perante as contingências da nossa vida profissional.
Numa época de esplendorosas conquistas, em que o facto substitui progressivamente a impressão, dir-se-há que o diagnóstico é hoje acto fácil, acessível a qualquer com um mínimo de conhecimento e disciplina.
As observações que se reúnem, deste modo, pretendem apenas demonstrar que, nesta época áurea do progresso médico, há ainda lugar para receios e que, sem a inquietação da dúvida metódica, o diagnóstico não será muitas vezes senão errado. O favor, que este volume recebeu do público, é a prova de que a consciência médica contemporânea continua insatisfeita na pesquisa da verdade. Apesar da grandeza que hoje rodeia o acto médico nele continua a não se avançar de jacto, os dados não são colhidos espontaneamente no decorrer da observação. Antes, pelo contrário, persiste e persistirá indefinidamente a necessidade de um estado de alma, que obriga cada um a viver um clima de aprendizagem permanente no sentido do saber e do compreender.
Sucede ainda que, ao lado da riqueza dos métodos semiológicos,
a crescente fascinação do progresso terapêutico, se por um lado é
maravilhosamente bem-vinda, por outro pode ser perigosa ao pretender colocar todo o problema médico num plano de novidade ou modernismo que se não integra no real distúrbio sob o nosso juízo.
Ao apresentar esta nova edição do volume I do «Erro de Diagnóstico» não pretendo senão voltar a chamar a atenção dos que me lerem para os vários percalços que seguem inevitavelmente o acto médico e que, se são sua natural condição, podem, no entanto, ser reduzidos perante normas e condições de exame, que remontando à sabedoria clássica, mantêm, no entanto, um rejuvenescimento que ousaria dizer eterno.
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INTRODUÇÃO
O diagnóstico é a preocupação fundamental do médico ao serviço do doente que se lhe aproxima. Impossivel fazer uma terapêutica conveniente sem o conhecimento exacto da causa ou causas, o seu mecanismo patogénico e a natureza e extensão das lesões. Só uma vez de posse de todos estes elementos o clinico pode agir com decisão e segurança, na certeza antecipada de que, mercê de adequada terapêutica, virá a cura desejada. No momento actual da ciência médica não é admissível a terapêutica polivalente dirigida a vários sintomas na esperança de que, entre tantas armas de combate, alguma venha a acertar. Este método terapêutico, sugestivamente designado de tiro ao alvo, do qual salienta sobretudo as incertezas, é uma dúvida sobre os modernos recursos da medicina que lhe permitem agir cada vez mais no meio de esclarecedora clarividência.
O médico do momento presente tem a preocupação de pisar o firme caminho da verdade, evitando que o seu raciocínio se distraia nos nebulosos trilhos da incerteza. Dispõe para isso de esteios seguros. Além da educação colhida nos bancos das escolas, no convívio diário com os seus autores e com os ensinamentos apurados na diária experiência, sabe que pode hoje dispor de métodos laboratoriais servidos por aparelhagem numerosa, de diversa complexidade, que conferem ao acto médico uma confortante segurança.
Mas não ignora também que a personalidade humana, sã ou vítima de causas mórbidas, não se repete igual através dos tempos e lugares, pelo que será sempre um campo interminavelmente curioso de pesquisa e de descoberta.
Quadros clínicos que foram objecto de descrições magistrais, cujo valor é atestado pela imutabilidade com que repetidamente são expostos, não se podem ter pois senão como esquemas dos quais o padecente se pode afastar em mais que um pormenor.
O voo magnífico da moderna medicina foi-lhe conferido pela crescente expansão do laboratório. Mas, poderá haver a certeza de que, mesmo com estes meios de valor tão considerável, que se poderia por vezes classificar de absoluto, será impossível o erro?
Non omnia possumus omnes. Ninguém pode ter a certeza de pos suir o pleno conhecimento das multiformes modalidades da tradução do fenómeno patológico, nem de todos os recursos que o laboratório pode por à sua disposição.
Dai a medicina continuar a ser um campo de interminável aprendizagem. A experiência será sempre a vera maestra, como no dizer expressivo de Galileu. Contràriamente à elementar sugestão de que tudo seria mais simples de futuro, sucede que, à medida de novos recursos, em paralelo surgem novos perigos de desvio, confusão, ou erro.
Numerosos são os clínicos que ao fim de uns anos de prática vêm a publico salientando dificuldades de diagnóstico que os embaraçaram ao longo da sua vida. Noel Fiessinger, com os seus Diagnostics Difficils e De Benediti, Marañon, M. Burger, ao falarem-nos largamente dos erros de diagnóstico, criam no leitor um estado de humildade perante as incertezas que, por vezes, vêm ao espirito e, o que pode ser mais grave,
à responsabilidade senão ao remorso de cada um.
Estas mesmas dificuldades persistem no momento de hoje.
Em tempos havia sobretudo que acusar o médico, o doente, a doença,
o ambiente, em que o exame clinico era feito.
Noel Fiessinger cita como defeitos do médico que levavam ao erro clinico, a ignorância, o cansaço, a desatenção natural, a distracção provocada por outros problemas, a pressa, a presunção, a confiança exagerada nos próprios méritos de observador excepcional, a fácil suges tionabilidade, a insensatez.
Os defeitos por vezes pertencem ao doente. Este é ignorante, não se sabe queixar, é prolixo, tem queixas exageradas, chama a atenção para sintomas secundários, omitindo inteiramente o principal, pode ser hostil a uma observação conveniente.
A doença pode ser também o responsável pelo erro de diagnóstico, pois o mesmo sintoma pode ser comum a diversas entidades mórbidas e a mesma doença pode expressar-se diferentemente em dois indivíduos.
O ambiente em que é feito o exame, ou pouco acolhedor, ou defestuosamente iluminado, ou com numerosos assistentes, quer incomodativamente vigilantes, quer turbulentos, quer reidosos, pode prejudicaro diagnóstico.
Exemplos de qualquer destas eventualidades pode qualquer médico vive-los numerosos ao longo da sua diária ocupação. O seu enunciado suficientemente vincado, para dispensar mais larga explanação.
Mas, hoje que a medicina se orienta e afirma cada vez mais pelo dado laboratorial positivo, pareceria que iríamos progressivamente abandonar o tactear na incerteza e seguiríamos em frente com absoluta segurança.
Infelizmente, e assim será sempre pela própria natureza do fenómeno humano, hígido ou patológico, a medicina será cada vez mais tema ciência, da certo, mas uma ciência que nunca dispensar não só o conhecimento, como a intuição e o bom senso.
Um exame laboratorial, bioquímico por exemplo, só terá valor quando interpretado de acordo com certos dados clínicos e outras elementos laboratoriais.
Um exame radiológico, por mais evidente que nos pareça, deverá ser sempre objecto de discussão, pois causas várias podem fornecer sombras radiológicas que se diriam pertencer a uma mesma causa definida. Igualmente exemplos numerosos destas várias eventualidades vêm facilmente à recordação de qualquer clinico experimentado.
Basta citar, por exemplo, o significado variável da urémia, da glicemia e a interpretação das provas de labilidade humoral tidas como próprias das lesões cirróticas do fígado.
No campo da radiologia, outra menção não é preciso senão recordar facilidade com que se ouve referências a lesões de natureza determinada, mas às quais se antepõe o prefixo pseudo.
Diremos ainda que, em tempos, a erro de diagnóstico não tinha perigo de maior. A medicina era principalmente de expectação. O médico preocupava-se eminentemente em não fazer mal, pois tinha que confiar exclusivamente na força curativa natural - vis medicatrix naturae.
A medicina era fundamentalmente uma arte clinica para saber valorizar suficientemente os sintomas fundamentais. Uma vez o diagnóstico assente não havia sendo que robustecer o doente, ajudando-o a suportar un malque a natureza se encarregaria naturalmente de debelar.
Cuidado havia que ter apenas em não o impelir no mau sentido.
Hoje a medicina é tão rica de possibilidades de diagnóstico como de possibilidades de cura. A medicina, de expectante, passou a ser actuante e oportunista. Conhece melhor as lesões, conhece-lhes as causas, pode atacar estas e, em muitas circunstâncias, pode atenuar senão remover as lesões, Dai, a prática da medicina que se considerava essencialmente um sacerdócio, que só podia ser exercido por quem estivesse largamente impregnado dos princípios da caridade ou amor do próximo, passou a ser uma profissão como qualquer outra, carente essencialmente dos conhecimentos científicos que a impregnam. Como em todo o acto social fica-lhe sempre bem a generosidade, a compaixão, a participação nas dores alheias, a caridade, mas estas obrigações morais quase se diluem, no momento presente, perante as suas caracteristicas de ciência positiva.
Se se perguntar ao doente como deseja que o tratem, se com caridade, se com competência, naturalmente responderá que deseja ser tratado dentro das duas condições ; mas, se tiver que optar, a lei natural da luta pela vida gritará que deseja ser tratado com competência.
Considerável responsabilidade vem para o médico de hoje. Não pode arrastar-se em delongas, apoiado em sugestões de um diagnóstico provável quando a medicina põe à sua disposição meios seguros de diagnóstico e de terapêutica.
O médico moderno respeita a sugestão clinica mas não é obstinado na sua crença. Não acredita nos diagnósticos relâmpagos, intuitivos, fulminantemente convincentes, de que ouviu falar com admiração, feitos por clínicos prestigiosos do passado. A consciência diz-lhe que tais diagnósticos relâmpagos são muitas vezes erros de diagnóstico que não resistem a uma criteriosa investigação clinica e laboratorial. Acredita sim na disciplina mental que o leva a apreciar o valor de uma causa e a seguir minuciosamente a evolução das lesões, ao abrigo de um critério simultaneamente clínico e laboratorial que pesa seguramente os vários dados do problema. Quem faz clinica num hospital universitário, sente sobre os ombros um acréscimo de responsabilidade, por os seus diagnósticos poderem vir a ser comprovados ou refutados na sala de operações ou na mesa certeza de que o diagnóstico que se faz será seguramente confirmado ou infirmado, de uma ou outra maneira, traz um acréscimo de autópsias.
A certeza de que o diagnóstico que se faz será seguramente confirmado ou infirmado, de uma ou de outra maneira, traz um acréscimo de inquietação ao seu autor
Se este tem hoje à sua disposição meios excepcionais de observação em paralelo com a qualidade dos meios terapéuticos, o erro deve afastar-sedo acto médico,
Se o médico sabe ainda que o valor do seu diagnóstico pode ser analizado por meios directos, objectivos, indiscutíveis, porá no seu exame conclusões uma atenção invulgarmente cuidadosa. Não faz mais que e seu dever, mas esta eventualidade reforçá-lo-á seguramente naquela intenção.
Recentemente, no pais ocidental em que a medicina se considera mais progressiva, fez-se a pergunta de como seria possível ainda melhorá-la admitindo que os recursos económicos atingissem, como parece estarem atingindo senão ultrapassando, as mais lisongeiras espectativas. Entre as várias sugestões sobressaiu a da necessidade do exame necrópsico em qualquer eventualidade com a obrigação de a ela assistir o médico assis tente.
Sem o conhecimento das lesões não há medicina cientifica e semmedicina cientifica não haverá progresso seguro.
À luz da anatomia patológica a visão da clínica torna-se invulgarmente nítida. Por outro lado o médico que sabe que o seu diagnóstico será discutido, terá de ser crescentemente atento, instruído e criterioso. Ninguém supõe, porém, que com tudo isto o erro virá a ser impossível em medicina.
As páginas que seguem e coligidas ao longo da vida de todos os dias, vêm em apoio do eterno errare humanum est, adaptável à medi cina humana como tudo em que o homem intervém.
Vividas através da própria inquietação, não visam outro fim senão reforçar o cuidado que qualquer de nós deve ter no juízo do sintoma ou do quadro mórbido, por mais indicativo que ele se nos possa apresentar.
Desde os bancos escolares, ao ouvir as lições de um dos maiores dinicos da sua época, fui ensinado na ideia de que em medicina não basta ser-se sábio, orador, insinuante, caridoso, imaginativo, mas que o clinico tem de prezar, acima de tudo, o método da dúvida, para se orientar dentro do que se designa como bom senso.
Sem dúvida não há correcto raciocinio e sem este não se atingirá nunca o diagnóstico perfeito.
E nesta era de esplendorosas descobertas que tão largamente atingiram o campo da medicina, diagnóstico perfeito é muitas vezes sinónimo de esperança, não tanto nos recursos naturais sempre imprescindíveis, mas, em muitos outros, que de modo avassalador vieram e vêm ao nosso encontro.
É em apoio desta necessidade do diagnóstico exato, que se traz um pouco da experiência própria e se esta é muitas vezes, como na irônica expressão de Oscar Wilde, apenas aquilo que cada um aprende com os próprios erros o certo é que o conhecimento havido da experiência dos outros nos serve frequentemente de condutor.
Escritas estas notas com a simplicidade inerente à seriedade do problema, e publicadas ao longo dos anos na Coimbra Médicas, são agora reunidas em volume.
Dedicadas, em especial, aos seus estimados colaboradores e alunos,o autor redigiu-as apenas com a preocupação da responsabilidade. Nelas perpassam alguns dos problemas da clinica, problemas que são na verdade de todos nós.
Se na quase totalidade das descrições se começa por um erro de diagnóstico não houve deste modo senão a intenção de pôr em evidência a facilidade com que qualquer clinico, entre os quais me conto, pode ser levado por uma falsa trajectória. Mas, se o erro é fácil e como tal desculpável ou aceitável, o mesmo se não dirá da persistência em certo diagnóstico quando já pouco a justifica.
O diagnóstico inicial não deve ser senão o ponto de partida para uma investigação larga e profunda no sentido do esclarecimento integral. Nada mais significa que o levantar de uma onda de inquietação que só pode cessar perante a plena descoberta da verdade.
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